Nesse período, houve avanços consideráveis na vida das famílias, que, além de recuperarem a autoestima e a privacidade, passaram a ter outras perspectivas como poder trabalhar, ter os filhos matriculados em escolas e possuir um endereço fixo.
Em seis meses, nove famílias conseguiram emprego com carteira assinada, sendo que quatro delas estão sendo preparadas para saída qualificada, ou seja, para conquistarem a autonomia, por meio de suas próprias rendas.
A outra vila, a Anhangabaú, não fica atrás: já são seis famílias trabalhando, sendo cinco delas no regime CLT, e a outra, como PJ (Pessoa Jurídica).
Os relatos de quem agora tem uma moradia digna são emocionantes. O caso de Viviane Aparecida Germano, que está na Vila Reencontro Anhangabaú, é um bom exemplo. Ela e os filhos moravam em uma comunidade na região central e, com ajuda dos assistentes sociais, conseguiram vaga em uma das casas modulares. Viviane hoje integra o Programa Operação Trabalho.
"Eu não sabia que era mobiliada. Foi uma grande surpresa. Só vim com a roupa do corpo e a televisão. É tudo de bom. Um chuveirinho para tomar banho e dar banho nas crianças, um ventilador. Eu não tinha nada disso. Se não fosse esse lugar aqui eu nem sei o que seria, porque talvez o barraco já tivesse caído na gente, pois as madeiras já estavam podres. Falei: ‘Ai, meu Deus, o que será que vou fazer da vida agora?’. Serviço, moradia, tudo de bom. Eu não tinha nem uma coisa nem outra. Agora tenho", disse.
Já o casal Kleber Fernandes de Athaide, 35, e Cintia dos Santos Freitas, 37, foram acolhidos na Vila Reencontro em abril deste ano, depois de ter que abandonar o apartamento onde viviam na zona norte por falta de condições para pagar o aluguel.
Foram morar na rua, depois levados a um hotel social, até que o serviço de assistência da Prefeitura encaminhou os dois, juntamente com o pequeno Anthony, de um ano e meio, para uma das casas da vila no Anhangabaú. "É a virada para uma nova fase da nossa vida. Hoje, temos estabilidade e autonomia aqui para também receber a nossa filha, que nasce daqui a dois meses", disse Kleber, que também recebe ajuda da Prefeitura para conseguir um emprego. "Nos estenderam a mão não só com essa casa, mas com dignidade, e isso é o que vai nos ajudar a levantar", afirmou Cintia.
Diariamente, as equipes multidisciplinares das vilas auxiliam no desenvolvimento interpessoal e comunitário das famílias, além de prestarem atendimento de acordo com as necessidades individuais dos acolhidos. No espaço, as crianças têm suas carteiras de vacinação colocadas em dia e recebem acompanhamento nutricional.
Outra característica das vilas é o modelo de administração sob responsabilidade da AVSI (Associação Voluntários para o Serviço Internacional), com supervisão da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social. A ONG, presente em mais de 30 países, tem expertise na promoção do desenvolvimento social.
Os acolhidos na Vila Reencontro são estimulados a participar de coletivos de limpeza, alimentação, cultura e lazer, horta e cogestão. Além disso, a rotina nas vilas conta com palestras, oficinas, atividades esportivas e de recreação, ioga, entre outras.
Ambas as vilas têm outra característica em comum: receberam intervenções artísticas de um coletivo de grafiteiros. Casas e paredes ganharam colorido e imagens que representam o "reencontro".
Ao receber as chaves de sua nova residência, a representante dos moradores da Vila Reencontro Cruzeiro do Sul, Jenneferly da Silva, emocionou a todos com suas declarações: "Nunca a Prefeitura teve um olhar humanizado como agora. A gente chegou numa situação dessa não porque quis. Estou há seis anos na luta por moradia digna. A vila é um passo para a nossa dignidade. Só a gente sabe o que passamos", afirmou.
A moradora continuou seu relato sobre o drama que viveu nas ruas. "Tenho dois filhos e sempre fomos apenas um número. Quando mando currículo, a empresa vê que a gente mora num abrigo, nem chamam. Ninguém sabe o sentimento de abrir uma geladeira, ter um banheiro só seu. Isso é dignidade que agora vamos ter", disse Jenneferly.
Para ter um ar ainda mais humanizado e colorido, a Vila Reencontro Cruzeiro do Sul recebeu desenhos feitos por um coletivo de grafiteiros composto por 11 homens e uma mulher. O layout colorido, retratado nas laterais das casas modulares e nas paredes de áreas comuns do espaço, reproduz uma leitura iconográfica, ou seja, imagens nas quais a temática "reencontro" é trabalhada inconscientemente.
"Tive o cuidado de conversar com os artistas e pedir que contemplem a cara de todos os povos, em todas as dimensões de população, que estão tendo uma chance de desenvolvimento e resgate da sua dignidade, por meio de um recomeço com uma casa", afirmou o líder do coletivo, Marcelo Zuffo, 51, professor de Arte e História da Arte e grafiteiro há 20 anos.
Em julho, a Prefeitura de São Paulo entrega outras duas novas vilas, uma no Pari (região central) e outra em Santo Amaro (zona sul). Serão 170 novas unidades modulares com capacidade para abrigar 680 pessoas.